Alberto da Cunha Melo, um dos expoentes da chamada "Geração de 65", em Pernambuco foi sem dúvida alguma, um dos maiores poetas da língua portuguesa, no século XXI.
Sersank
Uma poesia de sangue
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Escrito por Ângelo
Monteiro |
Sex, 01 de Fevereiro de 2008 |
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Fonte:
http://www.revistacontinente.com.br/index.php/component/content/article/2690.html,
acesso em 08jul2012.
Casa vazia
* Por Alberto
da Cunha Melo
Poema nenhum, nunca
mais,
será um acontecimento:
escrevemos cada vez mais
para um mundo cada vez menos,
para esse público dos ermos
composto apenas de nós mesmos,
uns joões batistas a pregar
para as dobras de suas túnicas
seu deserto particular,
ou cães latindo, noite e dia,
dentro de uma casa vazia.
Alberto da Cunha Melo*
* Alberto da Cunha Melo (José Alberto
Tavares da Cunha Melo) nascido em Jaboatão, Pernambuco, pertence à Geração 65
de poetas pernambucanos. Como Sociólogo atuou durante onze anos na Fundação
Joaquim Nabuco. Jornalista, foi editor do Commercio
Cultural do Jornal do Commercio, e da revista Pasárgada. Foi
colaborar da coluna Arte pela Arte, do Jornal da Tarde, SP, e mantém a
coluna Marco Zero, na revista Continente Multicultural.
Foi Vice-Presidente da União
Brasileira de Escritores em Pernambuco, na sua primeira gestão. Por duas vezes
Diretor de Assuntos Culturais da FUNDARPE e, recentemente foi um dos indicados
para o Prêmio Nacional Jorge Amado (2002).
Sua poesia não se rendeu ao charme
das vanguardas e encontrou no metro octossilábico (308 poemas, 4900 versos, em
cinco livros já publicados) , o mais raro em Língua Portuguesa, a
melhor melodia para o seu canto fraterno, e “sua lição de dor que se faz
beleza e arranca de si forças para construir uma poesia cujo nome secreto é –
resistência.” (Alfredo Bosi, no prefácio do livro Yacala).
Em 2001, foi incluído nas
antologias: Os cem melhores poetas brasileiros do século XX, Geração
Editorial, SP, e 100 anos de poesia. Um panorama do poesia brasileira no
século XX.
Em dezembro de 2002, publicou seu
12º título de poesia, Meditação sob os Lajedos.
Fonte:
http://www.jornaldepoesia.jor.br/acmelo.html
Obras
Publicadas
1966 - Círculo Cósmico -
Separata da revista Estudos Universitários, da UFPE - Recife - PE.
1967 - Oração pelo Poema -
Separata da revista Estudos Universitários, da UFPE - Recife - PE
1974 - Publicação do Corpo -
in Quíntuplo - Ed. Aquário - Recife
- PE.
1978
- Planejamento Sociológico- (em co-autoria com o sociólogo Roberto
Aguiar) - ed.
Massangana
- Recife - PE
1979 - Dez Poemas Políticos -
Ed. Pirata - Recife - PE
1979 - Noticiário -
Ed. Pirata - Recife - PE
1981 - Poemas à Mão Livre -
Ed. Pirata - Recife - PE
1983 - Soma dos Sumos - José
Olympio Editora\ Fundarpe - São Paulo - SP
1989 - Poemas Anteriores -
Ed. Bagaço - Recife - PE
1992 - Clau -
Ed. Universitária (UFRPE) - Recife - PE
1996 - Carne de Terceira com Poemas à Mão Livre -
Ed. Bagaço - Recife - PE
1999 - Yacala -
Ed. Gráfica Olinda - Recife - PE
2000 - Yacala -
(edição fac-similar) Ed. da Universidade Federal do Rio Grande do
Norte - Natal – RN
2001 –
Um Certo Louro do Pajeú (Reportagem)– EDFURN – Natal – RN.
2002 - Um
Certo Jó– Edições Uzyna Cultural – Recife – PE.
2002 -
Meditação sob os Lajedos - EDFURN/Bagaço - Natal/Recife - RN/PE
UMA
ESTRANHA BELEZA
Alfredo
Bosi
Não é por acaso que a epígrafe de Yacala é o verso de Cruz e Sousa: Vê como a dor te transcendentaliza”. A frase pungente do Poeta negro abraça de uma só vez as duas dimensões da obra de Alberto da Cunha Melo: a experiência funda do sofrimento, cuja origem é inequivocamente social, e a capacidade própria da linguagem poética de tudo passar pelo crivo da consciência pessoal, essa câmara de ressonância que acolhe, compõe e tonaliza os múltiplos estímulos que nos assediam e se fundem com nossa identidade.
A dor de viver provém de determinações inescapáveis:
o sangue, o sexo, a cor da pele, a classe social, o lugar da origem, o tempo e
o espaço do cotidiano; a sina, enfim. O poema aceita estoicamente os
sinais do corpo e os estigmas da circunstância; e os transforma, transfigura
ou, se a voz é sublimadora, os transcendentaliza.
A estranha beleza que sai dos versos de
Alberto da Cunha Melo nasce da fusão de um visceral sentimento da terra
(quantas imagens pejadas de lama e lixo, mangue e cinzas!) com a aspiração
infinita de quem está
mirando o mar e altas distâncias
numa luneta de escoteiro.
E, no fundo sem fundo do horizonte, o
que interessa é captar a luz da estrela, aquela estrela desgarrada da série
cósmica”, astro que pressagia o desastre. Yacala, o Galileu negro vidente de
todas as luzes do universo, é a figura nuclear que reúne cosmicamente baixios e
escarpas, o instante e o eterno, a dor e a sua transcendência.
Reciclando os dados do lixo,
busca Yacala, sobre a lama,
traduzir em cifras exatas
a voz do cosmo em voz humana,
domar a luz ou convertê-la
numa só e única estrela;
sem os galões da profecia
e as graças da revelação,
outro jamais rastrearia
aquela estrela sem fronteiras
a
engolir galáxias inteiras.
É uma narrativa da busca; uma narrativa que atravessa o sacrifício, a violência bestial e a morte inglória “para alcançar uma alegria / consciente, esplendor da razão, / livre como garra celeste, / que no Todo desaparece”.
Mas há, no plano formal, outra fonte de
estranheza nesta poesia, e que resulta em um efeito estético original. É o
paradoxo da sua composição ao mesmo tempo rebelde ao cânon e inventora de sua
própria e inflexível ordem estrófica e métrica. Estrófica: um quarteto na forma
abcb, um dístico rimado, um terceto na forma ded e um dístico final também
rimado. Métrica: todos os versos são octossílabos, o que produz um ritmo
inusitado, pois as narrativas poéticas longas são, em geral, plasmadas em
populares redondilhos maiores ou em clássicos decassílabos camonianos.
Trata-se de uma singular orquestração (o poeta chamou-a de “retranca”), que lembra remotamente o soneto inglês, mas que tem de seu o peculiar movimento musical de uma onda que, primeiro espraiada, depois recolhida, se embate por duas vezes nas barreiras sólidas dos dísticos do meio e do fecho.
O Nordeste nos dá, mais uma vez, depois do paraibano Augusto dos Anjos (presente de modo subliminar na atmosfera de várias passagens de Yacala), do alagoano Jorge de Lima e dos pernambucanos Carlos Pena Filho e João Cabral, a sua lição de dor que se faz beleza e arranca de si forças para construir uma poesia como a de Alberto da Cunha Melo, cujo nome secreto é resistência.
(Prefácio da edição fac-simille do livro
YACALA, UFRN, Natal, RN, 2000, incluído na obra Dois Caminhos e uma Oração)
Fonte:
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