quarta-feira, 30 de agosto de 2023

CRUZ E SOUZA - O "Cisne Negro" de nosso Simbolismo

 



Desconheço a autoria

Fonte: https://sibila.com.br/mapa-da-lingua/apontamentos-marginais-a-poesia-e-a-vida-de-cruz-e-sousa/4982


Vida Obscura

 

Cruz e Souza

 

Ninguém sentiu o teu espasmo obscuro,

ó ser humilde entre os humildes seres.

Embriagado, tonto dos prazeres,

o mundo para ti foi negro e duro.

 

Atravessaste no silêncio escuro

a vida presa a trágicos deveres

e chegaste ao saber de altos saberes

tornando-te mais simples e mais puro.

 

Ninguém te viu o sentimento inquieto,

magoado, oculto e aterrador, secreto,

que o coração te apunhalou no mundo.

 

Mas eu que sempre te segui os passos

sei que cruz infernal prendeu-te os braços

e o teu suspiro como foi profundo!


  
Florianópolis - SC

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TRADUKAĴO

 

Obskura Vivo

 

Cruz e Souza


Tuŝis neniun via spasmo obscura,

ho humilul’ inter la plej humilaj!

por vi estis je noktoj maltrankvilaj

la ebria, kapŝpina mond’ plezura.


 Transiris vi en senluma silento

vivon ŝarĝita da tragikaj devoj.

Atingis vin de la saĝec’ la revoj

kaj donis vin pli simpla, nobla sento.

 

Tuŝis neniun la dolor’ sekreta,

vundita kaj terura, malkvieta,

ke l’ koro en la mond’ vin ponardis.

 

Sed mi, ĉiam sekvante viajn paŝojn,

scias pri l’ infera kruc’, la maŝojn,

kaj ĝemojn viajn, ke en mi funde ardis!

 

 El la portugala lingvo tradukis Sergio de Sersank

Londrina-(PR), la 3-an de Setembro, 2023.


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Biografia

Cruz e Souza

 

João da Cruz e Souza nasceu a 24 de novembro de 1861, na cidade de Desterro, atual Florianópolis (SC). Seus pais, Guilherme da Cruz, mestre-pedreiro, e Carolina Eva da Conceição, foram escravos alforriados pelo Marechal Guilherme Xavier de Souza e sua esposa Dona Clarinda Fagundes Xavier de Sousa. Acolhido por eles, estudou nas melhores escolas da região. Aprendeu francês, latim e grego e foi discípulo do alemão Fritz Müller, com quem aprendeu Matemática e Ciências Naturais.

Com a morte de seus protetores, teve de deixar os estudos e trabalhar para sobreviver. Formou-se em Direito.


Em colaboração com Virgílio Várzez, publicou a coletânea de versos “Tropos e Fantasias” (1885). Como jornalista, militou numa grande campanha abolicionista em viagem iniciada no Amazonas e terminada no Rio Grande do Sul (1883).

 

Alvo de perseguições raciais, foi impedido de assumir o cargo de Promotor Público em Laguna (SC), por ser negro. Em 1890 foi para o Rio de Janeiro, onde teve contato com poetas e escritores adeptos ao movimento simbolista, especialmente o da França e seus admiradores cariocas. Colaborou em alguns jornais. No entanto, apesar de bastante conhecido, à época, nos meios literários pela publicação de “Missal” e “Broquéis” (1893), conseguiu apenas o modesto emprego de arquivista na Estrada de Ferro Central.

 

Casou-se com Gavita Rosa Gonçalves, também afrodescendente, com quem teve quatro filhos, três dos quais vieram a falecer, vítimas do “mal do século”. Para ela, especialmente, compôs o soneto “Madona da Tristeza” (Últimos sonetos). Gavita o acompanhou durante os seus últimos dias em Sítio, hoje Antônio Carlos, à época distrito de Barbacena (MG).

 

Conta-se que o poeta teria sido desalojado da Pensão em que se hospedara por estar vomitando sangue. Desamparado, o imortal poeta catarinense morreu na Estação Ferroviária, ao lado de Gavita.

 

Há relatos de que, por falta de recursos, o corpo do poeta foi transportado para o Rio de Janeiro num trem de cargas de animais e que este demorou seis dias para chegar ao destino. Gavita teria viajado ao lado do corpo, em decomposição, nesse longo trajeto. Grávida, deu à luz, mais tarde, o quarto filho deles, João da Cruz e Souza Junior. Mas é provável que essa viagem fatídica ao Rio de Janeiro, tenha sido, além das perdas dos filhos e do marido, a causa de sua internação depois, como paciente altamente depressiva e com sintomas de insanidade mental. Depois de passar por vários hospitais psiquiátricos ela veio a falecer em 1905, aos 27 anos de idade.

 

Cruz e Souza, incompreendido pela crítica, não chegou a conhecer a glória.

Morreu a 19 de março de 1898, aos 36 anos.  Seu corpo foi sepultado no cemitério São Francisco Xavier, no Caju, em sepultura adquirida por seu amigo, poeta e crítico literário, Nestor Victor.

 

Dentre muitos críticos literários que se manifestaram sobre a solitária grandeza poética de Cruz e Souza e realçaram seu valor na história da poesia mundial, há que se registrar a opinião de José Veríssimo que se opunha ao Simbolismo, mas em relação a Cruz e Souza, rendeu-se ao encantamento dos versos e a respeito dele escreveu:

 

“[...] como toda a arte tende ao absoluto, ao vago, ao indefinido, ao menos das comoções que há de produzir em nós, quase estou a dizer que Cruz e Souza foi um grande poeta e os dons de expressão que faltam evidentemente ao seu estro, os dons de clara expressão, à moda clássica, os supriu o sentimento recôndito, aflito, doloroso, sopitado, e por isso mesmo trágico, das suas aspirações de sonhador e da sua mesquinha condição de negro, de desgraçado, de miserável, desprezado. É desse conflito pungente para uma alma sensibilíssima como a sua, e que, humilde de condição, se fez soberba e altiva para defender-se dos desprezos do mundo e das próprias humilhações, que nasce a espécie de alucinação de sua poesia e que faz desta uma flor singular, de rara distinção e colorido, de perfume extravagante mas delicioso, no jardim de nossa poesia.”

 

Roger Bastide, eminente crítico francês, em ensaio aprofundado sobre o movimento simbolista, destaca a importância do nosso poeta, o que lhe dá “situação à parte na grande tríade harmoniosa: Mallarmé, Stefan George, Cruz e Souza.”  Para o exegeta, “a mensagem da sua experiência é apresentada aos homens em poesia de beleza única, pois que é acariciada pela asa da noite, todavia, lampeja com todas as cintilações do diamante.”


https://floripacentro.com.br/mural-de-cruz-e-sousa-tera-cisne-negro-e-poema-manuscrito/

  

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Obras de Cruz e Sousa


 1. Publicadas em vida

 

Missal (1893)

Broquéis (1893)

Evocações (1898)

 

2. Publicadas postumamente

 

 Faróis (1900)

Últimos Sonetos (1905)

Poemas inéditos (1996)

Últimos inéditos (2013)

 

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sexta-feira, 25 de agosto de 2023

ODE AOS MEUS PÉS

 



Foto de autor desconhecido


(Relembranças)

Sergio de Sersank

 

Nesta noite em que me vi mais só do que nunca

em que nem a música do rádio

a paz da lua cheia

ou as estrelas no céu sem nuvens

afastavam-me a melancolia -

esse gosto de licor amargo

que sempre quis evitar -

deixei a janela de vidro

sentei-me no leito hospitalar

e estou agora a tocar os meus pés.

                       

Dão-me notícias

de dias há muito arrancados

ao calendário dos anos:

 

trilhas

pastos plantações pomares

estilingue no peito

estradas boiadeiras

vendas vales valetas

pontes e rios.

 

Recordam-me esquinas cobertas de grama

peladas de futebol

pedras e chinelos demarcando

limites ao gol.

 

Dias de pipas ao vento

de andar pelas ruas com pernas de pau

carrinhos de rolimã

jogos de malhas nas ruas vermelhas

bola a doer nas queimadas

pulos de amarelinhas,

batidas de bets

partidas de bochas

pião bilboquê burquinhas.

Dias festivos:

quermesses

corridas de saco

pau-de-sebo

banhos de rio.

 

 

Velhos e sofridos pés.

Lembram-me a escola primária -

o edifício amarelado

de muros altos que não me continham

e onde a “Cartilha Suave”

do ler e escrever descortinou-me o mundo.

 

Saudade: aquelas manhãs de frio

o leite quente em casa

o pão de forno caseiro.

 

As aulas de Dona Filinha

inesquecível amiga:

ela toda atenção e carinho

e sempre um moleque ou outro

na sala querendo briga.

 

Enquanto corríamos doidos

os meninos

no recreio

ouvia a cantiga no pátio:

 

“Ciranda, cirandinha,

vamos todos cirandar

vamos dar a meia volta

volta e meia vamos dar.”

 

......

 

Ventura tocá-los ainda.

Estes pés rebeldes

cansados

já não se atrevem a colher mangas nos quintais vizinhos

mas me devolvem a grata magia

de viver sem pressa.

 

......

 

À luz de um poste fraquinha

ouço meninas e meninos.

Tento revê-los, um a um,

nos toscos bancos de madeira

os pés se tocando,

a empurrões e risadas.

 

Noites de lua (folguedos):

passa-anel

rei-rainha

pique-salva

garrafão.

 

Noites escuras e frias (o medo):

Tempos de afrontamento

às almas penadas das ruas

e a gente contando

causos de assombração.

 

.......

 

Perdi como perdemos

ao calendário dos anos

a infância

aquelas tardes de chuva fina molhando a roupa

seus dias plenos de sol.

 

.......

 

Meus pés. Estes pés. Tentativas

nem sempre bem sucedidas

de varar o pano dos circos.

Entradas triunfais no salão do cinema.

Passos a dois no primeiro namoro.

Passeios na praça da Igreja.

 

Estes mesmos pés no trabalho duro

mal remunerado

e em fuga da escola.

Meses de vadiagem

dificuldades sem fim.

 

O filho do sapateiro,

queria ganhar o mundo

e o tempo a girar continuamente

na ampulheta dos dias

fazia-me pescador que volta

sem peixe, ao cair das tardes.

 

Vieram lutas e lutas

ao longo da trajetória.

Um casamento acabou-se

ainda na mocidade.

O outro consolidado

na madureza, perdura.

 

Filhos nasceram, cresceram

e - partes dessa aventura -

deram-me netos, abriram

outros, melhores destinos.

 

Sabem estes pés

de envelhecidos sonhos

o menino que sou.

Sabem a força que têm

ao suportar o peso

da mente presa a um corpo material.

 

Agora,

chegada a vez de transpassar

a nebulosa ponte

que de tudo nos separa,

certo estou de retomar roteiros

que me serão necessários

e assim como de tudo me despeço

digo adeus aos meus pés.

 

Devo-lhes muito.

Sangrando por sendas de pedras

trouxeram-me ao tempo

que ansiava viver.

 

Afastam-me agora a tristeza.

Dão-me a certeza

de que sob as asas da alma

Não param. Não podem parar.

 

Aos píncaros mais altos da existência humana

meus pés

meus velhos, sofridos pés,

hão de, por certo, chegar.

 

 

Londrina, 20 de setembro de 2019.

 

 

 

 

COMENTÁRIOS:


Mary Fontán

 

Preciosa poesia!

FB, 25set2019

 

Delviene Oliveira:

 

Sérgio, bom dia! Obrigada pela atenção! Vi sua postagem agora pela manhã.

Vc é uma pessoa iluminada. Quanta sensibilidade... Meu Deus! Estou encantada! Um ótimo dia pra vc! Abcs meu amigo.

FB, 25set2019

 

                               Nicéia - J. Fagotti disse...

Somos caminheiros, mas depois de atravessar o rio os nossos pés criarão asas. Seremos alados! Glória!

quarta-feira, 25 de setembro de 2019 22:55:00 BRT 

 


Sergio de Seresank:


Essa espiritualidade, esse sentimento de perenidade existencial, é o que nos anima a prosseguir confiantes, independentemente de termos ou não uma religião. Segundo a Lei de Lavoisier "No Universo nada se cria, nada se destrói, tudo se transforma". Seremos também transformados em pura energia. Ao morrer, ganharemos, quem sabe, a condição de almas celestes, de almas filhas do espaço infinito de Deus.

quinta-feira, 26 de setembro de 2019 22:29:00 BRT 



terça-feira, 22 de agosto de 2023

O velho do espelho | Mário Quintana | Sonoridade Literária






https://www.youtube.com/watch?v=cMzSEqVAIlQ

"Mario Quintana nasceu em 1906 e morreu em 1994. Além de poeta, foi tradutor. Publicou seu primeiro livro em 1938: A rua dos cata-ventos. Recebeu os prêmios Fernando Chinaglia, Machado de Assis, e Jabuti, além do título de cidadão honorário de Porto Alegre, da medalha Negrinho do Pastoreio e do título de doutor honoris causa das seguintes instituições: Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Unicamp e Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

O poeta pertence à segunda geração modernista (1930-1945), marcada pela reflexão sobre o mundo contemporâneo e pela liberdade formal. No entanto, Quintana apresenta uma poesia mais individual, caracterizada pelo humor e pela simplicidade. Como bem se definiu o poeta, na revista IstoÉ: “Exatamente por execrar a chatice, a longuidão, é que eu adoro a síntese”."

Veja mais sobre "Mário Quintana" em: 

https://brasilescola.uol.com.br/literatura/mario-quintanapoeta-ultrassensivel.htm

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quinta-feira, 17 de agosto de 2023

POEMA DE KHALIL GIBRAN (Imperdível!)

 



Convidamos todos, leitoras e leitores do blog, a lerem este belíssimo poema de KHALIL GIBRAN.

Após sua transcrição em Esperanto, com a tradução de GEORGO ABRAĤAM, do Árabe, segue a íntegra da tradução que Sergio de Sersank fez, a partir dela, em Português do Brasil.

Ao final transcrevemos a biografia resumida desse grande escritor e poeta libanês que viveu grande parte de sua vida nos Estados Unidos, onde veio a falecer aos 48 anos de idade.

A pequena biografia nós a extraímos de outro interessante site literário.

Se vc não domina o Esperanto, pule para a tradução de Sersank en la portugala lingvo, cxu? (Ok?)

 

LA POETO

Ĥalil’ Ĝibran’

 

Mi estas fremdulo en ĉi tiu mondo.

Mi estas fremdulo kaj en la fremdeco

estas kruela soleco kaj doloriga tedo;

sed ĝi igas min pensadi pri ĉarma patrio, kiun mi ne konas,

kaj plenigas miajn revojn je bildoj de lando malproksimega,

kiun miaj okuloj ankoraŭ ne vidis.

 

Mi estas fremda al mia parencaro kaj al miaj amikoj.

Kiam mi renkontas iun el ili, mi diras al mi mem:

“Kiu estas tiu ĉi? Kiel mi lin ekkonis,

kia tradicio kunigis min kun li,

kial mi al li alproksimiĝas,

kaj kial mi sidas ĉe li?”

 

Mi estas fremda al mi mem:

kiam mi ekaŭdas la parolon de mia lango,

miaj oreloj trovas stranga mian voĉon.

 

Mi vidas mian kaŝitan memon ridanta kaj ploranta,

kuraĝa kaj timema;

mia estado admiras mian estadon,

kaj mian spiriton deĉifras la spirito mia,

sed mi restadas malkonata,

nemontrata per nebulo,

forkaŝita de l’ silento.

 

Mi estas fremda al mia korpo:

kiam mi staras antaŭ la spegulo,

ĉiam mi vidas en mia vizaĝo

tion, kion la profundoj de mia estaĵo ne enkaŝas.

 

Mi laŭiras la stratojn de l’ urbo

Kaj min sekvas la junuloj, kriante:

“Jen la blindulo; ni donu al li bastonon

por ke li sin apogu per ĝi.”

Kaj mi foriras de ili rapide.

 

Poste mi renkontas aron da knabinoj,

kiuj ekprenas min je la vesto, dirante:

“Li estas surda kiel ŝtono;

ni plenigu liajn orelojn je l’ melodio de la flirto.”

Kaj mi forlasas ilin kurante.

 

Poste mi renkontas grupon da plenaĝuloj,

kiuj stariĝas ĉirkaŭ mi, dirante:

“Ni rektigu la kurbecon de lia lango,

Ĉar li estas muta, kiel tombo.”

Kaj mi deiras de ili, timante.

 

Kaj poste mi renkontas grupeton da maljunuloj,

kiuj indikas al mi per fingroj tremetantaj kaj diras:

“Li estas frenezulo forperdinta sian prudenton.”

 

Mi estas fremdulo en ĉi tiu mondo.

Mi estas fremdulo, ĉar mi travojaĝis Orienton kaj Okcidenton

kaj ne trovis mian landon,

nek renkontis iun, kiu min konas

nek  kiun aŭskultis pri mi.

 

Mi vekiĝas matene kaj trovas min mallibera en senluma kaverno

de kies plafono dependas serpentoj

kaj ĉe kies anguloj abundas insektoj.

 

Poste mi aliras al la lumo, sekvata de l’ ombro de mia korpo,

sed la ombroj de mia animo iradas antaŭe de mi

tien, kie mi ne scias;

ili priserĉas aferojn,

kiujn mi ne komprenas

kaj tenas objektojn de mi nebezonatajn.

 

Kaj kiam vesperiĝas, mi revenas kaj rekuŝigas min

sur matracon elfaritan el strutaj plumoj kaj dornaĉoj.

Tiam, strangaj pensoj min ekposedas,

kaj transprenas min inklinoj ĉagrenaj,

ĝojigaj, dolorigaj, agrablaj.

 

Je l’ noktomezo envenas al mi,

el tra la fendaĵoj de l’ kaverno,

fantomoj de praaj tempoj kaj spiritoj de forgesitaj nacioj.

Mi ilin fikse rigardas kaj ili min ankaŭ rigardas fikse;

mi alparolas ilin demandante,

kaj ili respondas min ridetante.

 

Poste mi intencas preni ilin,

sed ili eknevidebliĝas

kaj neniiĝas kiel fumo.

 

* * *

 

Mi estas fremdulo en ĉi tiu mondo.

Mi estas fremdulo kaj ne ekzistas iu,

kiu scipovas eĉ unu vorton el la lingvo de mia animo.

 

Mi iras tra la dezerto

kaj vidas riverojn suprenirantajn el la profundaĵojn de l’ valoj al la montosupro.

Mi vidas, ke nudaj arboj sin kovras, belaspektiĝas,

ekfrutas kaj disigas sian foliaron en unu minute,

kaj poste, ke ties branĉoj defalas sur la herbetaron

kaj iĝas serpentoj tremantaj.

 

Mi vidas la birdarojn:

Ili deflugas, alteniĝas, malsupreniĝas,

ĝoje kantante kaj ululante.

Mi vidas, ke poste ili haltas kaj, malferminte la flugilojn,

ili fariĝas nudaj knabinoj kun longaj delasitaj hararoj kaj etenditaj koloj

kiuj rigardas min el palpebroj ombrumitaj per amo,

ridetas al mi per lipoj rozecaj,

ŝmiritaj per mielo,

kaj etendas al mi manojn blankajn, delikatajn, parfumitajn per olibano.

 

Poste, ekskuiĝante, ili malaperas for de mia vidado,

kaj neniiĝas kvazaŭ nebulo,

postlasante en la spaco

la eĥon de sia ridado kaj mokado pri mi.

 

Mi estas fremdulo en ĉi tiu mondo.

 

Mi estas poeto kiu versigas tion, kion la vivo proze verkas,

kaj prozigas kion ĝi verse komponas.

 

Tial mi estas fremdulo,

kaj mi restados fremda

ĝis la morto min prenos kaj transportos

al mia patrio.

 

(El la araba esperantigis GEORGO ABRAĤAM)

 

 

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O POETA

Khalil Gibran

 

Sou um estrangeiro neste mundo. Um estrangeiro.

E em terra estrangeira

a solidão é cruel,

é doloroso o tédio;

mas me fazem pensar

no país adorável que não conheço

e traz-me em sonhos imagens de um lugar longínquo

que os meus olhos ainda não viram.

 

Sou estranho para os meus parentes e amigos.

Quando encontro um deles digo a mim mesmo:

“Quem é este? Como o conheci,

que espécie de tradição uniu-me a ele,

por que dele me aproximo,

por que sento-me ao seu lado?”

 

Sou estranho a mim mesmo:

quando ouço a palavra de minha língua

soa estranha aos ouvidos minha voz.

Vejo meu “eu” oculto, rindo e chorando,

corajoso e com medo;

meu ser admira o meu ser;

revela-me em espírito este espírito meu,

mas permaneço desconhecido,

invisível na névoa,

oculto no silêncio.

 

Sou estranho ao meu corpo:

quando estou frente ao espelho

sempre vejo no meu rosto

o que minh’alma não sente

e encontro em meus olhos

o que as profundezas do meu ser não escondem.

 

Ando pelas ruas da cidade

seguido por rapazes que me gritam:

“Aqui está o cego. Vamos dar-lhe uma bengala

para que nela se apoie.”

Deles me afasto, depressa.

 

Depois encontro uma turma de moças

que me pegam pelas roupas dizendo:

“Ele é surdo como uma pedra;

vamos encher seus ouvidos

com a melodia da vibração.”

Eu as deixo correndo.

 

Mais tarde encontro um grupo de adultos

que se erguem ao meu redor, dizendo:

"Vamos endireitar a curvatura de sua língua,

porque ele é mudo como um túmulo.”

Me afasto deles, com medo.

 

E então eu encontro um pequeno grupo de idosos

que apontam-me com dedos trêmulos e dizem:

“Ele é um louco, perdeu o juízo.”

 

Sou um estrangeiro neste mundo.

Sou estrangeiro porque viajei de leste a oeste

e não achei o meu país,

nem encontrei alguém que me conheça

ou algo tenha ouvido a meu respeito.

 

Acordo de manhã e me encontro preso em escura caverna

em cujo teto penduram-se cobras

e em cujos cantos abundam insetos.

Então me aproximo da luz,

seguida pela sombra do meu corpo,

mas as sombras de minha alma vão antes de mim

para onde não sei;

procuram coisas que não entendo,

guardam coisas que não preciso.

 

E quando anoitece, volto e de novo me deito

sobre um colchão de penas de avestruz e espinhos.

Então, pensamentos me dominam.

Transpõem-me inclinações aflitivas,

alegres, doloridas, agradáveis.

 

À meia noite me vêm,

pelas fendas das cavernas,

fantasmas de antigos tempos,

espíritos de já esquecidas nações.

Eu os encaro de frente

e fixamente me encaram.

Pergunto-lhes certas coisas

e me respondem a rir.

 

Então pretendo tomá-los,

mas tornam-se invisíveis,

desaparecem como fumaça.

 

* * *

 

Sou um estrangeiro neste mundo.

Sou estrangeiro e não existe ninguém

que entenda claramente ao menos uma palavra

da língua de minha alma.

 

Caminho pelo deserto e vejo rios

a subir das profundezas dos vales

até o topo da montanha.

Vejo que as árvores nuas se cobrem, se embelezam,

começam a frutificar e espalham suas folhagens em um minuto.

E logo seus galhos caem sobre as ervas do chão

e tornam-se trêmulas serpentes.

 

Vejo bandos de pássaros voando, subindo, descendo,

alegremente a cantar e a uivar.

Vejo que, depois, param e, abrindo as asas,

tornam-se garotas nuas com longos cabelos esvoaçados

e pescoços esticados

que me olham com pálpebras sombreadas de amor,

riem para mim com lábios rosados,

untados de mel

e estendem-me suas alvas mãos, delicadas,

perfumadas de incenso.

 

Então, estremecendo, desaparecem de minha vista

e se esvaem como névoa,

deixando para trás, no espaço,

o eco de sua risada e motejo de mim.

 

Sou um estrangeiro neste mundo.

 

Sou poeta e faço em versos o que a vida em prosa escreve.

Faço em prosa o que a vida em versos compõe.

 

É por isso que sou estrangeiro.

Continuarei estrangeiro

até que a morte me pegue e me leve para o meu país.

 

(El la esperanta lingvo tradukis Sergio de Sersank)

 

 

Líbano 6 Jan 1883 / NewYork, 10 Abr 1931

 

 

BIOGRAFIA:

 

Khalil Gibran (1883-1931) foi um filósofo, escritor, poeta, ensaísta e pintor libanês. Sua obra reflete a espiritualidade e os princípios que levam aos patamares mais altos da alma humana. É conhecido por ter criado frases inspiradoras. Seu livro mais conhecido é “O Profeta”.

Khalil Gibran nasceu em Bsharri, nas montanhas do Líbano, no dia 06 de janeiro de 1883. Viveu a maior parte de sua vida nos Estados Unidos, para onde se mudou com sua mãe, o irmão e duas irmãs no ano de 1894. Nascido Gibran Khalil Gibran, reduziu seu nome para Khalil Gibran. Em 1898 retornou para o Líbano onde completou seus estudos árabes, no Colégio da Sabedoria, em Beirute.

Em 1902 voltou para os Estados Unidos. Nessa época escreveu poemas e meditações para um jornal árabe, publicado em Boston, chamado “O Emigrante”. Dedicou-se à pintura e ao desenho, numa arte mística que lhe é própria. Uma exposição com seus primeiros trabalhos despertou o interesse de Mary Haskell, diretora de uma escola americana, que lhe ofereceu um curso de artes em Paris. Publicou “A Música” (1905) e “As Ninfas do Vale” (1906).

Entre os anos de 1908 e 1910, Khalil Gibran estudou em Paris, na Académie Julien, onde produziu telas com temas místicos. Uma de suas telas foi escolhida para a Exposição de Belas Artes. Nessa época escreveu “Espíritos Rebeldes” (1908). Em 1910 volta para Boston e nesse mesmo ano muda-se para Nova York, onde reúne em volta de si, diversos escritores libaneses e sírios, que formam uma academia literária (A Liga Literária), que publicava duas revistas árabes:As Artes” e “O Errante”.



OBRAS ESCRITAS EM ÁRABE:

 

  • Música (al-Musiqah) - 1905
  • Ninfas do Vale (Ara'is al-Muruj) - 1906
  • Asas Quebradas (al.Ajnib al-Mutakassirah) - 1908
  • Espíritos Rebeldes (al-Arwah al-Mutamarridah) - 1908
  • Para Além da Imaginação (1910)
  • Lágrimas e Risos (Dam a wa Ibtisamah) - 1914
  • A Procissão (al Mawakib) - 1919
  • A Tempestade (al-'Awasif) - 1920
  • Em Direcção a Deus (Nawa Allah) - 1920
  • Irão, Cidade de Imponentes Pilares (Iram Dhat al-Imad) - 1921
  •  

OBRAS ORIGINALMENTE ESCRITAS EM INGLÊS:

 

  • O Louco (The Madman) - 1918
  • Vinte Desenhos (Twenty Drawings) - 1919
  • O Mensageiro (The Forerunner) - 1920
  • O Profeta (The Prophet) - 1923
  • Areia e Espuma (Sand and Foam) - 1926
  • O Reino da Imaginação (Kingdom of the Imagination) - 1927
  • Jesus, o Filho do Homem (Jesus, the Son of Man) - 1928
  • Os Deuses da Terra (The Earth Gods) - 1931
  •  

ALGUMAS OBRAS PÓSTUMAS:

 

  • O Vagabundo (The Wanderer) - 1932
  • O Jardim do Profeta (The Garden of the Prophet) - 1933
  • O Discípulo de Lázaro (Lazarus and his Beloved) - 1933
  • A Morte do Profeta (The Death of the Prophet) - 1933
  • A Voz do Mestre (The Voice of the Master) - 1963
  • Segredo do Coração (Secrets of the Heart) - 1947
  •  

Khalil Gibran faleceu, vítima de tuberculose, em Nova York, no dia 10 de abril de 1931. Após sua morte, foram publicados os livros: “O Errante”, “O Jardim Secreto do Profeta” e “Curiosidades e Belezas”.

 

Fonte:

https://amantesliterarios.wixsite.com/livros/single-post/2018/01/06/khalil-gibran

 

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COMENTÁRIO DE ISABEL FURINI, laureada poeta e escritora sobre a obra poética "Estado de Espírito"

http://www.icnews.com.br/2013.03.05/negocios/livros-de-negocios/estado-poetico-de-espirito/

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HINO OFICIAL DE LUIZ ANTONIO

Letra: Sersank (Sergio S. Cunha)
Música: Irineu Santa Catarina


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https://www.youtube.com/watch?v=FmWSt6RqGs4

BEBO PAROLAS EN ESPERANTO

ESPERANTO: La solvo (A solução)

ESPERANTO: La solvo (A solução)

Veja aqui a NOTA da Prefeitura Municipal de Londrina sobre o lançamento doLivro de SERSANK

http://www.londrina.pr.gov.br/index.php?option=com_content&view=article&id=17367:sergio-sesank-lanca-estado-de-espirito&catid=88:cultura&Itemid=975

EL VIAJE DEFINITIVO - Poema de Juan Ramon Jimenez

https://www.youtube.com/watch?v=GspatgDGhO8&feature=emb_rel_end