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sábado, 10 de agosto de 2013

PÁGINA DE SERSANK PARA O 'DIA DOS PAIS"





Uma Tarde
Sergio de Sersank

“Aquém dos retratos de pé sobre a mobília, não aceito, pai, as mortes neste tempo em que o ser humano finda sem cumprir-se. Que foi sua vida senão colecionar escadas para elevar-nos a uma altura maior que suas derrotas?”
Moacyr Felix (Em nome da Vida)


Aquela fora, sem dúvida, a mais fria das tardes do outono. Ao pé do velho fogão de lenha aceso, meus irmãos menores e eu, metidos em blusas e japonas bem surradas, esperávamos impacientes pelo jantar muito simples que as mãos prodigiosas de nossa mãe esmeravam-se em tornar do agrado geral. Inusitado ruído na porta da frente, então, sobressaltou-nos. Seria o vento?
Nosso pai que estava algo absorto junto à mesa ergueu-se e, foi destrancá-la, cautelosamente.
Eram os velhos espectros da Miséria e do Infortúnio, o par sinis­tro, inseparável, que não se cansa de rondar lares humildes, tudo fazen­do por roubar-lhes as poucas reservas de paz, a leve esperança que têm.
Com sua energia característica, embora a custo, ele os conteve, à porta. Sobre os seus ombros, uma e outra, as tais formas horrendas, lançavam sobre nós os seus olhares sepulcrais. Exortadas com veemên­cia, tornaram à rua estreita onde a espessa neblina as tragou.
– “Que não ousassem jamais adentrar-nos a casa!”
Nunca mais pude esquecer essa firme expressão de coragem.
– “Que não ousassem!”...
Quantas vezes mais tarde insistissem, mais que com a energia dos braços, fustigá-las-íamos com brio idêntico àquele que vimos, na­quele dia, estampado no olhar de guerreiro de um pai.


Do livro “Estado de Espírito” (Ed. Ithala, Curitiba, 2013)




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