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domingo, 23 de outubro de 2011

ALERTA AOS GOVERNANTES


Fonte:



Ei-los, Senhores, dispersos,
sob lajes e viadutos.
Quase mendigos, matutos,
vivem a esmo, sem lar...
Consigo levam crianças,
mulheres e anciãos.
Vede, têm marcas nas mãos
da sina de trabalhar!

Por sítios, os mais distantes,
erram prestando serviços.
São modestos, submissos,
provados nas aflições.
A suor e lágrimas regam
nossos prados verdejantes.
Vede que têm nos semblantes
sulcos de mil privações...

Parias - que sejam - não querem
de vis esmolas viver:
Sabem lutar e sofrer.
A vida os talhou assim.
Deles fez - homens valentes,
firmes na fé. Deu-lhes brio
para arrostar fome e frio
dias e noites sem fim.
  
Vede: por certo divagam
pensando o incerto amanhã:
O lar - sua Canaã -
a roça...  Alguns animais...
À vida simples do campo,
por tesouros, desencavam
os sonhos que acalentavam
seus pais e os pais de seus pais...

Em grave êxodo urbano
estão por todo o país.
Se a elite, avara, os maldiz,
materna, a terra os atrai.
Unidos nas suas dores
só desejam, na verdade,
viver com dignidade.
Força nenhuma os retrai.

Temei, se ocultais a posse
de terras improdutivas,
porque hão de fazê-las, vivas,
medrar ao poder da enxada!
Temei-os, porquanto esperam,
já com fúria incendiária,
por essa "reforma agrária"
prometida e postergada.

Vede que ganham a estrada,
se agrupam, se fortalecem.
Seus ímpetos recrudescem
num movimento maior.
E é então que, sob um comando
ousado em suas ações,
preparam as invasões
e esperam pelo pior.

Se, rechaçados, reagem,
estrugem as carabinas
e o sangue dessas chacinas
mancha a terra. Faz história.
Vede que levam crianças,
mulheres e anciãos.
Todos têm marcas nas mãos -
as marcas da lide inglória...

Vede: já não se dispersam
pensando o incerto amanhã:
Querem sua Canaã...
Força nenhuma os retrai!
Em grave êxodo urbano
estão por todo o país.
Tirana, a elite os maldiz, 
materna, a terra os atrai!

                         (Poema de solidariedade ao MST - Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra)


(Do livro "Estado de Espírito")


                              Fonte:

sábado, 22 de outubro de 2011

DESAFOGO

Catulo da Paixão Cearense



 (Poema humorístico, em memória de Catullo da Paixão Cearense)



O mundo, agora, é concreto,
não tem luar, nem seresta.
Amar virou palavrão...
 Hoje em dia, camarada,
poesia é uma charada,
o poeta um charlatão.

Seus versos –  termos dispersos –
não têm ritmo ou cadência.
Se lhes sobra inteligência,
ressentem-se de emoção.

Aplaudem-nos, acadêmicos,
como linguagem de escol.
          E a eles, horas a fio,
dedicam-se. É um desafio...
          Que tempo “chove-não-molha”!
          Que dias de insosso sol!

Será que uma vez na vida
essa gente esclarecida
parou pra ver a alvorada,
as aves em revoada,
o campo, sob o arrebol?

Poeta de hoje, a contento,
não dá azo a sentimento,
não provoca frenesi.
Cultiva a verve sistêmica;
está mais para a polêmica
do que para a arte em si.

Já não escreve, “digita”.
Não sofre.  Não explicita
o que propõe-se a escrever.
São-lhe madrastas as musas,
e suas odes, confusas,
só louco as pode entender...

(Da coletânea "Estado de Espírito", de Sersank)

(Direitos autorais registrados e protegidos)

terça-feira, 18 de outubro de 2011

PARADOXO





Por mais dolorosas as nossas vidas,
todos amamos viver.
Mas, via de regra, somos suicidas
sem a pressa de morrer.

Matamo-nos a cada gole,
a cada louca noitada,
a cada sonho desfeito.
Matamo-nos por qualquer coisa,
no mais das vezes, por nada.
E achamos que está direito.

Matamo-nos simplesmente
por amar, por odiar, por ter ciúme,
por medo de não prosperar.
Em nós percutem chibatas,
clamores, gritos de guerra.
Os trafares do avatar.

Suicidas, quase todos,
na louca lufa-lufa de viver,
assusta-nos tanto o futuro
que enclausuramos os sonhos
no sótão do desquerer. 
E, embora nos mostremos
aos outros sempre felizes,
temos ânsia, temos tédio,
temos pressa de viver...

Um dia, senhores do mundo,
os homens dominaremos
todo o sistema solar. 
Mas se não nos dominarmos,
                                       a Terra, a nau que nos leva,
                                       por causa dos nossos conflitos,
pode vir a  soçobrar.



(Do livro "Estado de Espírito" de Sergio de Sersank)

terça-feira, 11 de outubro de 2011

À VELHA ÁRVORE






Árvores são poemas que a terra escreve para o céu. Nós as derrubamos e as transformamos em papel para registrar todo o nosso vazio.  Kahlil Gibran


  
Parece que foi ontem.  Bem me lembro!...
Era um final de setembro,
manhã já bem alta, assim...
Chegáramos de mudança à nova casa.
Erguias-te, frondosa, junto à cerca,
num dos cantos do jardim.
                     
Tudo mudou na circunvizinhança.   
A rua mesma, quanto está mudada!
Na quadra à frente,
em bairro transformada,
remanescia um verde cafezal.
A casa, todavia, em nada se assemelha
àquela, pequenina, de horta no quintal.

Eras bem jovem, ainda,
singela, mas alta, mas linda
e linda hoje estás, velha Sibipiruna!
Assim que te vimos, assim
que, sob a tua  fronde, nos reunimos,
foi grande o bem-estar que nós sentimos.
E eu disse, à meia voz, enternecido:
- Esta árvore, meus filhos, vale uma fortuna!                              
Revejo-te crescendo, as podas, as floradas,
o porte vicejante ao perpassar dos anos.
No agror dos insucessos meus, cotidianos,
andava acumulando madrugadas,
mas tínhamos um balanço para as crianças.
Riam, riamos, então, e que risadas!... 

Recordo, ao te rever, aquelas cenas
envoltas na magia desta mesma brisa
que sinto agora, a passar.
Um chamariz de beija-flor naquele galho
agora alto demais,
um ninho, um novo ninho de pardais.

Desaba, um dia, a tormenta:
vem a casa a ser vendida.
Temos de partir e lá deixar-te.
A vida, todavia, que me há dado tanto,
tantas e tão gratas emoções,
foi pródiga até mesmo em conservar-te!

Nas lides sempre difíceis
dos anos que transcorreram
os meus meninos venceram,
estão felizes e bem.
Queria poder dizer-te
que somos gratos por tudo.
Faço-o por eles também.

Ah, velha árvore querida,
já só, como ficaste e ausente,
eu varo o inverno da vida
sem nada a lamentar do que perdi.
Minh’alma a escancarar as janelas dos olhos
rebusca a nitidez com que sonhava a realidade
e, assim, tocada pelos ventos da saudade
vem repletar-se de ti...

sábado, 8 de outubro de 2011

SAM'KIEL SAP'VEZIKOJ







Cxio ajn kio ni supozas enhavi,
aux ke ni volas posedi en la Ter’,
pro tio ke ili vere ne pezas,
simile al sap-vezikoj
tuj ekflugas, tuj disigxas.
Cxio klinigxas al efemer’.

Nenio, neniu, neniaj
ni povas preni el la Ter’.
Simile al sap-vezikoj
tuj ekflugas, tuj disigxas
cxiaj aferoj en la aer’.

Pli granda alia aer-veziko
estas nia blua sfer’.
Gxi eble rondiras sencele
movita je sencxesaj blovoj
de ia infana sun-dio
ludante en la vasta eter’...

(El la  libro   "Stato de la spirito", de S. Sersank)


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