Sem lar, que sonha a criança
nos véus da noite que avança
ao cintilar dos néons?
Há fantasmas, ao relento,
uivando, uivando no vento,
não pode ter sonhos bons...
Ecoam nos seus ouvidos
os tétricos estampidos
da noite da Candelária.
E sofre – não há contê-los -
os suplícios – pesadelos
da convivência diária.
Ecoam nos seus ouvidos
os tétricos estampidos
da noite da Candelária.
E sofre – não há contê-los -
os suplícios – pesadelos
da convivência diária.
Mal sabe seu sobrenome
e, arrostando frio e fome,
com outras iguais, ao léu,
já não se ilude: a aventura
do seu viver será dura,
sem fada ou Papai Noel.
Sem um tutor que a estime
descamba às raias do crime,
toma gosto ao que é ruim.
Fuma o crack, cheira cola,
bebe, briga, se estiola,
desumaniza-se, enfim.
Por certo, revel, rejeite
afagos de mão piedosa.
Só sabe a mão asquerosa,
que, de outros olhos oculta,
o submundo comanda
e em horrífica ciranda
bem cedo lhe faz adulta.
Assim, no escoar dos dias,
sepultando fantasias,
o que esperar do amanhã?
Nega-lhe o fado que a isola
o seu direito a uma escola,
ao lar, a uma vida sã...
Quantas vezes
lhe negamos
um gesto de
cortesia,
o agasalho
em noite fria,
a cédula para o pão.
E se namora, esfaimada,
guloseimas na vitrine,
não é raro que termine
enxotada como um cão.
É inconcebível que clame
diante de nossos ouvidos
e nós – seus irmãos crescidos -
não lhe queiramos ouvir.
E assim viva expatriada,
sob o céu de seu país,
sem chances de ser feliz,
sem ter para onde ir.
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Sem lar, que sonha a criança
nos véus da noite que avança
ao cintilar dos néons?
Há fantasmas, ao relento,
uivando, uivando no vento,
não pode ter sonhos bons...
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