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domingo, 3 de julho de 2011

POEMA DO INJUSTIÇADO (Em seus instantes finais)




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Ouço as vozes.  Ouço os passos...

Ei-los!...  Vêm brandindo os braços,
têm as ganas de Caim.
Vêm aos gritos, agitados,
olham por todos os lados,
seguem-me os passos, assim...

Precisavam de um culpado
para dar por encerrado
o seu macabro festim.
Oh, meu Deus, esses bandidos
já não podem ser contidos
e há um muro diante de mim...

Não são poucos.  Ouço-os perto.
Vejo os vultos. Já por certo
Antegozam o meu fim.
Não terei quem me defenda,
não importa que me renda,
que peça clemência, enfim.

Eis que me avistam.  Eu tremo,
esmurro o ar e blasfemo,
maldigo a canalha ultriz!
Prosto-me ao chão, derrotado
e ao filme do meu passado
Assisto. Sou meu juiz.

No assombro que me avassala
tudo a esvair-se me fala
das estultices que fiz.
Exaurido, o peito arfante,
eis-me num quadro de Dante.
Ensandeço.  Caio em prantos.
Vejo as sobras, pelos cantos,
do mundo, outrora, feliz...

Num julgamento sumário
tenho meu próprio Calvário
como Dimas, o ladrão...
Ai, meu Deus!  Estão à frente!
Erguem-me, violentamente,
assim me trucidarão!...

A lembrança de Jesus
alçado à infamante cruz
um certo alívio me traz!
Mas, minh'alma, em dor pungente,
mais não logra, infelizmente
do que esse instante de paz...

Ouso afrontá-los!  Não tenho
do martírio - a vocação.
Matem-me, pois, carniceiros!
Chamá-los-ão "justiceiros"
por troféu me exibirão.
Mas só terão um cadáver.
ao homem nunca terão.

                                                                                                        Libelo contra a PENA DE MORTE


(Do livro "Estado de Espírito", de Sersank)

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